Contrato administrativo – prestação de serviços – equilíbrio econômico-financeiro – manutenção – teoria da imprevisão – majoração de encargos sociais e trabalhistas – dissídio coletivo – revisão contratual – impossibilidade
“Mandado de segurança. Administrativo . Contrato de prestação de serviços. Manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. Via processual adequada. Teoria da imprevisão. Majoração de encargos sociais e trabalhistas em razão de dissídio coletivo. Revisão contratual. Impossibilidade. Precedentes do STJ. 1. Não se sustenta a alegação do Ibama no sentido da inadequação do mandado de segurança para o pedido em apreço, porquanto, ao contrário do que diz a autarquia, não se trata de ação de cobrança, mas de pedido de repactuação de contrato administrativo para fins de reequilíbrio econômico-financeiro. A prova documental trazida pela impetrante demonstra que dirigiu pedido ao Ibama durante a vigência do contrato . Com a negativa da entidade, postulou em juízo a repactuação da remuneração pela prestação de serviços . 2. No caso de comprovada defasagem da contraprestação devida pela Administração Pública em razão de inesperado evento que sobrecarregue o custo do serviço prestado pela contratada, remanesce seu direito à obtenção da diferença correspondente ainda que extinta a relação contratual, sob pena de enriquecimento sem causa da parte contratante. 3. A aplicação da teoria da imprevisão e o restabelecimento da equação econômico-financeira do contrato dependem da ocorrência de evento imprevisível quanto à sua ocorrência ou às suas consequências e que o fato, alheio à vontade das partes, seja inevitável e tenha relevante impacto no contrato . 4. A impetrante arrola, como fundamento de seu pedido de repactuação, a majoração dos encargos trabalhistas e sociais de seus empregados em razão de dissídio coletivo da categoria profissional, fato que alega ter alterado o equilíbrio do contrato . A situação, todavia, não caracteriza imprevisibilidade a autorizar a revisão contratual. Precedentes do STJ. 5. Apelação do Ibama e remessa oficial a que se dá provimento. Segurança denegada.” (TRF 1ª R. – Ap-RN 0042860-84.2010.4.01.3400 – Relª Juíza Fed. Maria Cecília de Marco Rocha – DJe 20.04.2016 – p. 859)
Comentário Editorial SÍNTESE
Assim leciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro, sobre a Teoria da Imprevisão:
“No direito brasileiro, essa teoria tem sido aceita pela doutrina e jurisprudência. Em matéria de concessão de serviços públicos, Celso Antônio Bandeira de Mello (1975b:47) sempre entendeu que a Administração tem o ônus do restabelecimento integral do equilíbrio econômico, seja qual for o tipo de álea. À vista do art. 167 da Constituição de 1967, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 1/1969, que impunha a fixação de tarifas que assegurassem ao concessionário a justa remuneração do capital, o melhoramento e a expansão do serviço e o equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
A Constituição de 1988, embora contenha dispositivo análogo, concernente à concessão, não repete a norma sobre tarifa, remetendo à lei ordinária a incumbência dedispor sobre política tarifária (art.175, parágrafo único, III). Apenas se estabelece, de maneira muito vaga, que os contratos de obras, serviços , compras e alienação serão contratados mediante cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, ‘mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei’ (art. 37, XXI). Essa norma tem sido interpretada fazendo referência ao equilíbrio econômico-financeiro; porém, é uma garantia de âmbito restrito, pois não abrange todas as modalidades de contratos da Administração.
No entanto, é certo que o antigo Decreto-Lei nº 2.300/1986 já havia incorporado em seu texto, a aplicação da teoria da imprevisão, ao permitir a alteração docontrato , por acordo das partes ‘para restabelecer a relação, que as partes pactuaram inicialmente, entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção inicial equilíbrio econômico e financeiro do contrato’ (art. 55, II, d).
Essa norma ficou excluída da Lei nº 8.666/1993 (art. 65), em decorrência de veto do Presidente da República, mas foi restabelecida pela Lei nº 8.883/1994, com nova redação, em que ficam claras as exigências de que se trate de fatos imprevisíveis ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis; que esses fatos retardem ou impeçam a execução do contrato e configurem álea econômica extraordinária ou extracontratual.
Aliada essa norma aos princípios já assentes em doutrina, pode-se afirmar que são requisitos para restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, pela aplicação da teoria da imprevisão, que o fato seja:
1. imprevisível quanto à sua ocorrência ou quanto às suas consequências;
2. estranho à vontade das partes;
3. inevitável;
4. causa de desequilíbrio muito grande no contrato.
RSDA Nº 128 – Agosto /2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA 209
Se for fato previsível e de consequências calculáveis, ele é suportável pelo contratado, constituindo álea econômica ordinária; a mesma conclusão, se se tratar de fato que o particular pudesse evitar, pois não será justo que a Administração responda pela desídia do contratado; só o desequilíbrio muito grande, que torne excessivamente onerosa para o contratado, justifica a aplicação da teoria imprevisão, pois os pequenos prejuízos, decorrentes de má previsão, constituem álea ordinária não suportável pela Administração. Além disso, tem que ser fato estranho à vontade das partes: se decorrer da vontade do particular, responde sozinho pelas consequências de seu ato; se decorrer da vontade da Administração, cai-se nas regras referentes à álea administrativa (alteração unilateral e teoria do fato do príncipe). Não se pode esquecer que a solução, adotada na Lei nº 8.666, não se aplica aos contratos de parceria público-privada, disciplinados pela Lei nº 11.079/2004, tendo em vista que seu art. 5º, III, prevê a repartição dos riscos nos casos de caso fortuito, força maior, fato do príncipe e áleas econômicas extraordinárias.” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2015. p. 330, 331)